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Vidas pantaneiras importam 

O Pantanal já estava em chamas quando propusemos a criação da Comissão Temporária Externa do Senado. O fogo descontrolado tinha consumido 1/4 de todo o bioma. E, infelizmente, não parou por aí. A par das medidas adotadas para o combate aos incêndios, mais de 2,2 milhões de hectares se transformaram em cinzas, conforme dados do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama/Prevfogo) em parceria com o Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais.

Mesmo com ações dos governos federal e dos estados, é preciso reconhecer que as chegaram com atraso. Os alertas da ciência não foram ouvidos, como deveria e por quem deveria. Brigadistas, bombeiros e voluntários, os que vivem no Pantanal e ainda aqueles para lá se deslocaram ,em esforço e atitude heroica, se lançaram numa epopeia heroica. Mas, infelizmente, a guerra contra o fogo foi perdida. 

É bom que que se diga, até por justiça, que as condições climáticas não favoreceram e os recordes de incêndios florestais no Pantanal foram enfileirando mês após mês, assustando a todos. 

A cena dantesca está posta. Resta-nos inaugurar uma fase de planejamento para que ano que vem, e os próximos quatro anos de severa estiagem prevista para a região, não se congratule com o que estamos vivendo nesse período, isto é, a destruição da fauna e da flora que consagraram o Pantanal como um dos mais importantes patrimônios naturais da humanidade, reconhecido com reserva da biosfera pela Organização das Nações Unidas. Que haja esse planejamento.

Importante ressaltar que no requerimento, de minha autoria, que criou a Comissão Temporária Externa, há entre os objetivos proposto “a proteção das populações diretamente atingidas” pelo desastre ambiental. Nesse sentido, já é passada da hora de se enxergar também as famílias que lá se encontram, muitos vivendo uma hereditariedade de séculos. São índios, quilombolas, ribeirinhos, a mulher e o homem pantaneiro; o dono de pousada, proprietários rurais – gente que por anos e anos convivem harmonicamente com esse bioma, e que carecem de atenção para que possam reconstruir suas vidas. 

Famílias perderam casas e suas criações, suas plantações (muitas de subsistência) que estão a necessitar de apoio, que vem chegando timidamente pela ação do  voluntariado e  de organizações populares. 

Daqui a pouco – é vital que se observe –  virá a ‘decoada’, movimento das cinzas levadas pelas chuvas aos córregos, rios e nascentes, causando a mortandade de peixes. Ou seja, essas famílias sequer terão o peixe para pescar e se alimentarem. 

Urge que o Governo Federal convoque os governos de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul para fazerem, somados, esse grande enfrentamento – tanto quanto tem sido o combate ao fogo, para que se garanta que o ser humano habitante do Pantanal possa ter o apoio necessário para retomar sua vida. 

Resgatar o homem pantaneiro é essencial ao próprio bioma, já que são eles, em última análise, que, por séculos, tem vivido, subsistido e  ajudado na preservação deste santuário, atuando como verdadeiros guardiões. Há tempos desassistido, eles, seguramente, esperam por uma ação que vá além de cestas básicas – verdade, necessárias neste primeiro momento. O que se espera é que se estruture um programa de apoio na qual possam recorrer para subsidiar as perdas. 

Insisto: o Estado brasileiro deve agir, até para se afastar da sua pior característica, qual seja, a de não ter tradição de planejamento, fazendo tudo às pressas, no afogadilho do momento, perdendo recursos financeiros e energia humana para não se passar por negligente. Nesse caso, agora, está em jogo a vida de milhares de pessoas. E vida de pantaneiros importam.

 

Wellington Fagundes é senador por Mato Grosso e presidente da Comissão Temporária Externa do Pantanal